terça-feira, 25 de setembro de 2007

Ukemi

UKEMI
A Arte de Ser Uke
Texto traduzido do livro The Principles of Aikido, escrito por Mitsugi Saotome, e extraído do site: www.aikidobahia.com.br - Academia Central de Aikido - Bahia

Para se praticar Aikido, a presença de um parceiro é essencial. Uns poucos exercícios podem ser feitos isoladamente para melhorar sua força e suas habilidades técnicas, mas o caminho para o bom treino reside na interação entre uke e nage. Algumas pessoas erroneamente simplificam as definições de uke e nage como "aquele que ataca" e "aquele que defende". Tais simplificações não demonstram a verdadeira natureza da importância dos papéis de nage e uke.
De um modo mais correto, nage significa "aquele que projeta" e uke, "aquele que recebe a força". Se você pensar em termos de quem ataca e de quem se defende, provavelmente você dará mais importância ao papel do nage, que é atacado e executa a técnica, e colocará o papel do uke como sendo apenas o de fornecer um corpo para o nage executá-la. Nada poderia ser mais longe da verdade.
Ukemi é a arte de ser uke, e a qualidade do treino de nage depende em como uke aprendeu sua arte. Ukemi é responsável pela criação de condições que levam uma dada técnica a ser praticada, permitindo a uke responder corretamente aos movimentos de nage, executando qualquer queda que seja necessária para finalizar tal técnica. Resumindo, uke é responsável pela criação de condições que permitam nage aprender. Se uke não sabe os efeitos de determinada técnica, ou não tem nenhuma flexibilidade, ou não responde aos movimentos de nage, ou ainda, é temeroso ou pouco acostumado a cair, então nage não terá condições de estudar as técnicas eficazmente.
Ao praticar qualquer movimento, os parceiros devem alternar os papéis de nage e uke. Quando estiver no papel de uke, não julgue esta hora como sendo apenas um intervalo entre os momentos de ser nage, mas como uma oportunidade de igual ou maior importância de aprender do que aquela de quando se está na outra posição. De fato, aqueles que se esmeram na prática de ukemi também o farão, eventualmente, na prática das técnicas, pois eles serão capazes de absorver conhecimentos através de seus corpos, de sentir como age uma técnica corretamente executada, assim como absorvem conhecimentos pelas suas mentes. Desenvolver bom ukemi é a maneira mais rápida de adquirir habilidade no Aikido.
Muitos elementos compõe o bom ukemi. O primeiro é musubi (Conexão harmoniosa; nossa união final com a vida e o Universo). Boa comunicação com o nage é indispensável, tanto física quanto intuitiva. Se o uke é insensível aos movimentos ou intenções do parceiro, vai obstruir a prática deste último e correr riscos de se machucar. Um bom uke não antecipa os movimentos do parceiro, mas se aperfeiçoa na percepção até o ponto em que as reações são instintivas e intuitivas, em lugar de depender exclusivamente da manipulação física.
Aprender ukemi é aprender a proteger o seu corpo de lesões; precisa-se estar sempre alerta e flexível. Deve-se ser capaz de executar a queda de qualquer ângulo, a qualquer momento, mesmo inesperadamente. Tais habilidades conduzem ao aprendizado de técnicas mais avançadas.
Também se deve treinar ukemi enquanto se segura jo e bokuto. O treinamento com armas no Aikidô inclui algumas técnicas de desarme. Muitas delas envolvem projeções e o uke precisa estar preparado para isso. Aprender a se proteger através do ukemi é também responsabilidade de todos. Enquanto o nage deve ter consciência das limitações do uke e evitar excessos desnecessários, ele tem o direito de esperar do uke um nível de habilidade em seu ukemi compatível com o nível de graduação. Se a sua capacidade em executar ukemi é inferior a sua habilidade com as técnicas a medida que evolui, então o avanço técnico do seu parceiro será prejudicado. Por vezes, coloca-se muita responsabilidade com relação à segurança pessoal nas mãos do parceiro, especialmente quando se começa a treinar técnicas mais avançadas, mas o próprio treino vai ser prejudicado, pois nunca será capaz de executar as técnicas mais difíceis com toda intensidade.
Executar ukemi não significa que se faz papel de derrotado. É, na verdade, um estudo de comunicação, percepção e auto-proteção. Refletindo mais profundamente, é um meio de adquirir controle sobre si mesmo e sobre as circunstâncias. Esse aspecto do ukemi se torna mais aparente no treinamento mais avançado, quando as técnicas vão além de se ter apenas um uke atacando, ocorrendo múltiplos ataques de várias direções e várias inversões de movimentos. A sensibilidade e a atenção concentrada no nage, que permitem alguém ser um bom uke, também dão a habilidade de ver as falhas na técnica do nage e reconhecer os pontos onde este está vulnerável. Se você é um bom uke você pode tirar proveito disso e fazer uma rápida recuperação ou reverter o movimento. Se ukemi não é bem treinado, então não se terá equilíbrio suficiente para fazer nenhum dos dois.
Aprender ukemi, é claro, leva tempo e muito treino. Ao principiante será mostrado o conceito de ukemi lentamente. Depois de conhecer os movimentos de irimi e tenkan, começará a praticar as quedas e rolamentos. Isso deve ocorrer antes de começar a treinar as técnicas básicas. Quando começar a praticá-las, isso será feito através do kata. Kata dá ao estudante um modelo para treinar e explorar os efeitos dos diferentes movimentos, aperfeiçoando sua execução. Deve-se chegar ao domínio completo do movimento antes de se tentar um uso mais criativo dos movimentos de Aikido, além de ser cada vez mais elástico na execução do ukemi. O jiju waza, quando se é esperado que as reações sejam espontâneas aos diferentes movimentos e projeções, deve ser reservado aos praticantes mais experientes. À medida que o treino evolui, sempre lembre que o caminho para obter a habilidade em executar movimentos mais espontâneos e criativos está no aperfeiçoamento do ukemi.
Durante minha época como uchi deshi, eu fui muito advertido por não fazer um bom ukemi. Os ensinamentos de O'Sensei a respeito desse assunto, assim como eu os lembro, podem ser resumidos assim:
  1. Não tente antecipar o que está por vir. Uma mente tendenciosa vai obscurecer as resposta intuitivas do corpo e irá refreá-lo. Isso forçará você a fazer um ukemi pouco espontâneo, o que, por sua vez, irá refletir quando treinar as técnicas, atrasando o seu aperfeiçoamento.
  2. Observe os movimentos do seu parceiro e tente sentir sua intenção. Isso é parte do treino de ukemi.
  3. Não se esqueça da relevância do treino de ukemi para a vida diária. Todas as pessoas proeminentes que alcançaram alguma coisa de valor na vida, absorveram os princípios do ukemi. A jornada da vida é marcada por muitas dificuldades. Sucesso é alcançado por aqueles que venceram suas dificuldades com flexibilidade e a mente aberta de ukemi. Aqueles que executam o ukemi de uma maneira pouco natural durante o treino, não verá resultados positivos da prática na sua vida diária.
  4. É sábio evitar acidentes e lutar pela sua bem-aventurança, tanto no dojo quanto fora dele.
  5. Uma mente aberta e flexível, assim como o corpo, modéstia, sinceridade - esses são os elementos necessários para a arte do ukemi. Sem eles, o treino de ukemi não progredirá. Sem ukemi, o treino das técnicas nunca irá fluir.
Observe as palavras de O'Sensei com relação à importância do ukemi na vida diária. Ukemi desenvolve a habilidade de sentir o que está por vir, de analisar as circunstâncias e de responder às mesmas rapidamente. Assim como aqueles que antecipam o ukemi durante o treino e falham ao tentar adivinhar a direção da técnica, são aqueles que pensam demasiadamente e falham em perceber o que está ocorrendo em torno de si próprios. Eles não conseguem ser flexíveis às dificuldades na vida porque não podem vê-las até que seja tarde demais. Treinando-se bem ukemi, ter-se-á uma visão verdadeira do fato, baseada na observação e intuição, e não em algum pensamento arbitrário e pré-concebido. Bom ukemi representa a mesma sabedoria do pescador que, através de sua experiência, sente como vai ser o tempo.
O treino de ukemi tem grande mérito físico: ele fortalece o corpo e aumenta sua flexibilidade. Além disso, quanto mais você se acostumar ao ukemi, mais prazeroso fica o treinamento. Eu me lembro da alegria de O'Sensei durante os treinos, seu ânimo e seu bom humor. Para se ter prazer no treino não precisa perder a concentração; pode-se relaxar e, ainda sim, treinar seriamente. Dificilmente se pode negar os benefícios do ukemi no treinamento e na sua vida diários.

quarta-feira, 19 de setembro de 2007

Sankyo (kote hineri)

Sankyo (kote hineri)

Controle por torção do pulso.
Para executar o movimento pode-se pensar nos movimentos de "espada": saque, estocada e corte.

  • Saque: captura do movimento do uke, levando-o para uma posição favorável, i.é. controlado, para que a técnica seja aplicada.
  • Estocada: manter a mão, o pulso e o antebraço alinhados (estendidos) como se fosse uma "espada" (boken). Executar a torção do pulso através dos metacarpos da mão do uke e não dos dedos, pois o uke pode dobrar o pulso e os dedos podem escapar, dobrar ou até quebrar. Pelos metacarpos a pegada fica muito firme. Assim pode-se levar, com um movimento ascendente de torção, o uke até uma a posição em que ele ficará desequilibrado, na ponta dos pés, sendo essa a posição de hasso do boken. Ou com com uma pressão e controle do antebraço do uke, na horizontal - o ombro e cotovelo mais baixos do que a mão - pela mesma pegada, na forma de tsuki ou estocada com o boken.
  • Corte: terminação através do aprisionamento do uke no chão pelo seu ombro ou a projeção para longe do nage.

Anatomia
Cada membro superior é composto de braço, antebraço, pulso e mão.
O osso do braço – úmero – articula-se no cotovelo com os ossos do antebraço: rádio e ulna.
O pulso constitui-se de ossos pequenos e maciços, os carpos.
A palma da mão é formada pelos metacarpos e os dedos, pelas falanges.


O metacarpo é a porção média da mão, ou seja, o conjunto de ossos dos membros anteriores ou das extremidades superiores, que articulam com os ossos do carpo e com as falanges proximais dos dedos.
O metacarpo que suporta a "palma" da mão.
O carpo é formado por 5 ossos alongados.
Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.

quinta-feira, 13 de setembro de 2007

MEDITAÇÃO

MEDITAÇÃO
Jomar Morais

Jomar Morais nasceu em Recife, Pernambuco, em 1953.Trabalhou em vários jornais e revistas, entre os quais Folha de São Paulo, O Estado de São. Paulo, Jornal do Brasil, Veja, Exame e Superinteressante.Atualmente é editor especial da Editora Abril (unidade de tecnologia e turismo). Estudioso das tradições sapienciais do oriente e do ocidente, pesquisa e pratica meditação regularmente.

PARAR, RESPIRAR, AGRADECER
Para meditar você precisa estar pronto. Isto é, precisa estar no momento certo de sua vida, aquele em que se encontra preparado para ouvir sua voz, seu coração, sua respiração. Coisas simples. Parar e respirar.Só você, pela decisão de experimentar e pela persistência em prosseguir, será capaz de dizer o que melhor combina com o seu perfil.

AQUI E AGORA
A maioria das pessoas nunca está por inteiro onde estão os seus corpos. Pensando bem, essa é a própria rotina de nossa mente, sempre pronta a sair do rumo cada vez que tentamos direcioná-la para o que está acontecendo.
Essa mente desatenta sustenta as ilusões que nos impedem de enxergar a vida como ela é e, sobretudo, turva a percepção de nós mesmos, obscurecendo a visão de nossa essência mais pura. Nessa essência, o verdadeiro ser, repousa a consciência serena, fonte de paz e alegria. Mas a mente tumultuosa cria um falso eu, prisioneiro do medo, que gera e perpetua o sofrimento. A poderosa mente humana, dinâmica e impetuosa, é também plástica e disciplinável. Logo, pode ser purificada e transformada, se abordada corretamente.
Meditar é aquietar a mente, esvaziando-a do redemoinho de pensamentos que nos distraem sem tirá-la do estado de alerta.

O LUGAR DA MENTE
"Quem sou eu?" Mergulhando em nosso mundo interior, sempre acabamos constatando que somos, na essência, algo bem maior que o nosso corpo e a nossa identidade pessoal.
Tomemos emprestada a técnica de auto-indagação de Maharshi para uma investigação sobre a natureza da mente:
  1. Pare, respire profunda e suavemente e dirija a atenção para dentro de você.
  2. Procure observar seus pensamentos. Não os julgue nem os retenha. Apenas os contemple em sua seqüência ininterrupta.
  3. Depois de algum tempo, questione: quem está observando? Percebeu? Se você pode "ver" os pensamentos se sucedendo em sua mente, então existe algo por trás deles. Existe algo que os observa. Você é o observador. A mente, o objeto observado.

"Você não é a sua mente". A mente subsiste na consciência, mas esta prescinde da mente e do pensamento para existir.
A mente é um aspecto operativo da consciência, amplo e poderoso, a própria função construtora da realidade do aparato mental. As estruturas cognitivas se refletem no mundo concreto a tal ponto que, ao olharmos para um objeto, não é o objeto em si o que vemos, mas a nossa própria mente. Considere, por exemplo, uma cadeira convencional, de madeira. Observe-a. Certamente, você a reconhecerá em seu conjunto e a chamará de cadeira, pois neste momento você é um observador que vê o conjunto, a cadeira. Mas você pode transformar essa percepção internamente e enxergar ali apenas madeira, se estiver procurando madeira. Por que você pode ver apenas madeira onde antes via cadeira? Porque sua mente mudou, você mudou. E quando você muda, o objeto muda. Imagine que, ao vê-la, você disse: "Que linda cadeira. Gostei dela". Agindo assim, teria direcionado ao objeto impulsos atrelados a emoções, forjando um tipo de causalidade responsiva - ou seja, algo que, ao surgir, nos impulsiona para outra coisa - que é uma forma de prisão da mente.

O objetivo da meditação é superar esse programa, libertando a mente do condicionamento, da escravidão ao processo cármico e impulsivo.

A FORÇA DA MOTIVAÇÃO
Por que queremos meditar? Por que desejamos disciplinar e ampliar a mente? É importante que encontremos a resposta certa para a pergunta.
Se optarmos pela motivação adequada, antes mesmo de nos sentarmos, impulsionaremos a mente para o lugar onde a clareza está. Então, tudo ficará mais fácil. Com a motivação, criaremos o ambiente onde a mente se colocará, seguida pela energia e pelo corpo.
O essencial é saber ver. Saber ver
Sem estar a pensar. Saber ver quando
se vê, e nem pensar quando
Se vê, nem ver quando se pensa.
Fernando Pessoa

A MENTE MEDITATIVA
A QUEBRA DOS GRILHÕES INTERNOS
Apreender o sentido da meditação (ou do zen) exige mais o esforço de esvaziar a mente do que enchê-la com conceitos e definições. Compreende-se o que é meditar, sobretudo meditando. Mas o aprendizado da arte meditativa precisa levar em conta, como estágio inicial, um trabalho de desconstrução. É preciso despojar a mente de conceitos e preconceitos originados em condicionamentos e fixações, a fim de torná-la apta a ver a paisagem sem nódoas e a ouvir a harmonia dos sons sem ruídos. A mente meditativa está mais próxima da mente da criança, sempre interessada em observar e fazer descobertas, do que da mente do erudito, que para tudo tem uma resposta pronta. É a mente do principiante, buscadora e cheia de possibilidades, em que não há obstáculos erigidos sobre pré-conceitos.

ALÉM DAS POLARIDADES
Como interromper essa avalanche cármica, liberando a mente para a ação tranqüila? A liberdade será alcançada pela observação do próprio processo de prisão da mente, o que inclui a auto-observação da vontade e da imaginação. Trata-se de um trabalho que requer esforço redobrado no início. Mas basta isso para quebrar o circuito monopolizado pelas alternativas polares, do tipo "Devo continuar com essas idéias porque..." e "Não devo continuar com essas idéias porque..." Esvaziando-nos de desejos e contentando-nos em examinar como os pensamentos operam, sem nos apegarmos a eles ou rejeitá-los, cortamos a retroalimentação do processo, e o condicionamento morre por asfixia. A liberdade de criar e optar é, então, restabelecida.
O fato é que os pensamentos não são apegados a nós. Estão sempre fluindo, surgem e desaparecem. Nós é que tentamos retê-los ou rejeitá-los. Cada vez que isso acontece, aprisionamo-nos a eles, travando uma luta inglória e dispensável que apenas impede o surgimento da idéia criativa.

CRIATIVIDADE INTERNA
Parar, ampliando o hiato entre a percepção e o pensamento, é o modo de romper o automatismo dos registros da memória, a fim de que se possa ver além das alternativas polarizadas.
Como qualquer um de nós pode comprovar, ter poucos desejos e encontrar satisfação nas coisas simples é um caminho de paz e serenidade que acrescenta á vida uma profunda liberdade: eis um dos maiores atributos da mente meditativa.

A PRÁTICA DA MEDITAÇÃO
O CAMINHO E A CAMINHADA
Eis a questão: como é possível esvaziar a mente, focar no presente... enfim, meditar? A experiência milenar dos iogues e monges nos legou muitos ensinamentos nesse sentido. O resto descobrimos ao longo da prática. Nenhum exercício em particular será bom para todos. Importa que cada pessoa avalie se uma prática específica lhe é ou não apropriada. Feita a escolha, porém, é recomendável persistir no exercício escolhido, a fim de se aperfeiçoar na execução de seus procedimentos.
A meditação é uma investigação interior em que o meditador é ele próprio cientista, cobaia e laboratório. Qualquer que seja o tipo de prática escolhido, alguns elementos básicos não podem ser ignorados.

CONCENTRAÇÃO E PERCEPÇÃO
As diversas modalidades meditativas estão agrupadas em duas categorias: meditação por concentração e meditação por percepção. Ambas nos levam a focar no presente e a romper a identificação com o ego, mediante a constatação de como os hábitos manipulam nossa vontade. Diferenciam-se, porém, quanto ao modo de usar a atenção e à intensidade do esforço empregado pelo meditador.
Quando mantemos a atenção sem julgamentos na respiração, em um mantra (um som com ou sem significado) ou em algum objeto específico (visualização), estamos meditando pela via da concentração. Nesse caso, permanecemos atentos ao conteúdo de um único pensamento, sem nos preocuparmos com a sua direção, o que nos permite centrar no presente em vez de fugir com o pensamento para o passado ou para o futuro. Já quando paramos e tomamos consciência do fluxo natural dos pensamentos, praticamos a meditação perceptiva, em que percebemos a movimentação dos pensamentos sem nos fixarmos em seus conteúdos. Nessa situação, transformamo-nos em meras testemunhas, desapegadas, igualmente centradas no aqui e agora. É como se estivéssemos deitados no chão, com os olhos bem abertos, assistindo ao desfile de nuvens no céu. Uma nuvem é sucedida por outra, mas permanecemos ali, imóveis, apenas registrando formas brancas que surgem e desaparecem contra o mesmo fundo azul.
Ambas nos habilitam a fixar a atenção por períodos mais ou menos longos, mergulhando-nos em profunda paz, enquanto os pensamentos circulam em torno de nosso foco sem nenhum poder de distração.

POSTURAS MEDITATIVAS
A estabilidade do corpo é a grande âncora da meditação, a imobilidade do corpo disciplina a mente inquieta, restringindo suas opções de foco.

Quando perguntamos a um monge ou a um iogue qual a melhor postura para meditar, a resposta é flexível: depende de cada pessoa, de cada corpo. Qualquer postura é ideal, desde; me a coluna esteja ereta, com a cabeça e o tronco alinhados.
A posição tradicional é a da flor de lótus. As mãos podem ser apoiadas sobre os joelhos ou compor o chamado mudra cósmico, postura em que o dorso da mão esquerda é apoiado sobre a palma da mão direita, com as juntas dos dedos médios encostadas umas sobre as outras e as pontas dos polegares se tocando levemente à altura do umbigo, for­mando um oval. Os olhos focam o chão, num ângulo de 45 graus, com as pálpebras abertas ou semicerradas (pode-se optar também por manter os olhos fechados). A língua, enrolada para trás, toca o céu da boca. A respiração, abdominal, dá-se com a entrada e saída do ar apenas pelo nariz.
Trata-se de uma postura simbólica, a flor de lótus mantém a pureza absoluta, mesmo tendo a sua raiz na lama.
Há sempre a possibilidade de meditar sentado numa cadeira, encostado na parede, em pé, deitado ou em qualquer outra postura confortável que deixe corpo e mente em harmonia. Cada posição provoca uma mudança de energia que será sentida durante a prática. A meditação deitada não é recomendada, para iniciantes, em razão da possibilidade de induzir ao sono.

SILÊNCIO E RESPIRAÇÃO
A disciplina do silêncio e a consciência da respiração são fatores importantes na meditação. O silêncio e a respiração serena nos permitem ver além das imagens, além da forma. Percebemos então as energias internas - o amor, a compaixão, a raiva etc. — e, a partir da consciência de sua presença, podemos harmonizá-las, estabilizá-las ou transformá-las na meditação. Na prática, fazemos isso focando a mente na respiração. Ficamos atentos à entrada e saída do ar pelas narinas e inspiramos e expiramos suave e profundamente.
O tipo de respiração apropriada é a abdominal ou diafragmática, assim chamada por produzir a dilatação do diafragma, o importante músculo que separa a cavidade torácica da abdominal. A inspiração deve jogar o ar para a base dos pulmões, produzindo uma sensação de enchimento do abdômen, quatro dedos abaixo do umbigo. A expiração deve ser plena e no mesmo ritmo. É fácil. É o nosso modo natural de respirar, aquele que é demonstrado diariamente pelos bebês e por todos nós quando estamos dormindo profundamente. A respiração torácica é resultado da restrição das vias respiratórias, causada por fatores físicos e, principalmente, pelo medo e a ansiedade.

O PAPEL DO MANTRA
Esvaziar a mente significa ajustar o fluxo do pensamento, diminuindo sua velocidade e reduzindo-o, na concentração, a um fio condutor que leva a único ponto. Mas quando isso não ocorre na simples experiência do silêncio e da respiração consciente (ou quando se deseja catalisar o processo meditativo), pode-se recorrer a uma técnica milenar capaz de facilitar o ajuste sem reprimir a dinâmica do fluxo mental: o mantra.
Em sânscrito, mantra quer dizer "aquilo que liberta a mente". Trata-se de um som, com ou sem significado, que, pronunciado repetitivamente, ajuda a manter a atenção no agora.
Na meditação, o mantra funciona ao privar os sentidos de qualquer outro estímulo, exceto ele próprio. É um auxílio importante para a concentração mesmo entoado mental­mente, como ocorre na maioria das vezes. Qualquer praticante pode criar o seu mantra individual.

A OPÇÃO DAS VISUALIZAÇÕES
A visualização é uma técnica importante na prática meditativa. Pode-se visualizar desde uma luz até a figura de um mestre, uma deidade ou uma paisagem tranqüilizante. A exemplo da concentração, o objetivo aqui é focar a atividade mental, mas de uma forma que exige menor esforço.

Na visualização, a mente cria um espaço ilusório, fica aprisionada ao que ela criou e segue respondendo dentro do contexto da paisagem mental.

A OPÇÃO DOS KOANS
O koan, usado com exclusividade pelos seguidores da linhagem zen do budismo, é um problema passado pelo mestre ao discípulo a fim de que, na tentativa de solucioná-lo, o aluno possa romper os padrões da mente condicionada.Por exemplo: "Uma vaca passa por uma janela. Sua cabeça, chifres e as quatro pernas passam. Por que o rabo não passa?"

DURAÇÃO DA PRÁTICA
Uma sessão formal de meditação compõe-se de uma preparação, a prática e a sua conclusão.
Na etapa inicial é feito algum exercício de alongamento visando preparar o corpo para manter-se imóvel e confortável na posição de lótus ou em outra postura escolhida para a meditação. É importante a observância do silêncio e da respiração ou um breve relaxamento ao som de um mantra, um canto ou mesmo música clássica.
A duração da prática varia de acordo com a capacidade de concentração, a resistência física e a experiência de cada meditador. Para iniciantes com hábitos urbanos, é razoável a prática meditativa durante 20 minutos, se possível duas vezes ao dia. Outra opção é acordar cedo e dedicar de 40 minutos a uma hora ao não-fazer.
Depois que o corpo sinalizou a hora de encerrar a prática, o melhor é continuar respirando conscientemente por mais algum tempo, evitando levantar de um salto. Comece a saída movendo lentamente os dedos. Em seguida, se estava meditando de olhos fechados, abra-os devagar. Mantenha a atenção sobre todas as etapas do movimento de saída.

Se você continuar esta simples
prática todos os dias obterá
um poder maravilhoso.
Maravilhoso antes de ser atingido,
mas nada especial uma vez atingido.

Shunryu Suzuki

ESCOLHA A SUA
AS VÁRIAS TÉCNICAS DE MEDITAR
ZAZEN — é a prática de meditação sentada da tradição zen, uma linhagem do budismo bastante difundida no Japão. É uma das técnicas mais simples e mais conhecidas em todo o mundo. Aqui o importante são o esforço e a disciplina na prática, com observação da postura. Para muitos mestres do zen, a postura é, em si, o propósito da prática.
  • Sente-se no chão (ou sobre uma almofada), coloque o pé direito sobre a coxa esquerda e o pé esquerdo sobre a coxa direita - a posição de lótus.
  • Mantenha a coluna, o pescoço e o tronco numa linha reta.
  • Coloque a mão esquerda sobre a palma da direita, com as jun­tas dos dedos médios encostadas umas sobre as outras e as pontas dos polegares se tocando levemente. As mãos devem estar junto ao corpo, com os polegares à altura do umbigo.
  • Os braços devem permanecer relaxados e ligeiramente afastados do tronco, como se houvesse um ovo em cada axila.
  • Não se incline para qualquer lado.
  • Mantenha os olhos semicerrados, neste caso olhando num ângulo de 45 graus para o chão ou para a parede.
  • Concentre-se na respiração. Observe o ar tocando as pontas das narinas. Conte suas inspirações de 1 a 10 e, então, reinicie a contagem. Caso não consiga completar a série (muitos iniciantes se perdem já na terceira inspiração), não se inquiete. Apenas retorne ao início da contagem sempre que isso acontecer.
  • Não busque um estado especial da mente. Não busque qualquer resultado. Apenas sente-se e observe. É assim que mente e corpo permanecem juntos, presentes onde você está. Isso é zazen.

Observação: caso não consiga sentar-se em lótus completo, tente a postura meio lótus, com apenas um dos pés sobre a coxa oposta. Ou ainda a posição um quarto de lótus, com um pé debaixo da coxa oposta e o outro sob a panturrilha da perna contrária. Se você tem problemas físicos, sente-se numa cadeira que lhe permita manter a coluna ereta.

SHAMATA — é um tipo de meditação estabilizadora, com foco na respiração, muito usada por algumas linhagens do budismo. Ajuda a relaxar e ampliar a capacidade de atenção.

  • Sente-se na postura de lótus ou naquela que lhe for mais confortável, tendo o cuidado de manter a coluna ereta.
  • Mantenha os olhos abertos, fixando-os em algum ponto, num ângulo de 45 graus. Para facilitar, você pode colocar, a sua frente, algum objeto que o ajude a fixar o olhar na angulação recomendada. Olhe para o objeto suavemente. Pode piscar o olho, se necessário.
  • Focalize a atenção sobre a ponta de suas narinas, percebendo a sensação causada pelo ar entrando e saindo. Realize a contagem de 1 a 10, a exemplo do que é feito no zazen.
  • Se preferir, em vez da ponta das narinas, focalize o movi­mento do abdômen a cada inspiração e expiração, fazendo a contagem.
  • Em qualquer das opções acima, respire profunda e suave­mente.
  • Ao surgirem pensamentos, não reaja com apego ou rejeição. Não se sinta frustrado. Persista.
  • Isso se torna mais fácil se você imaginar a sua mente como um céu claro onde nuvens surgem e logo desaparecem, sem perturbar a paisagem calma.
  • Quando estiver apto a evitar as distrações, passe a fazer notas mentais sobre a natureza dos pensamentos que surgem sem, no entanto, retê-los nem perder a consciência de sua impermanência. É o suficiente para não conceder poder às distrações, fazendo cessar o conflito.

PERGUNTA E RESPOSTA
Diante de um problema inesperado, na rua ou no trabalho, como poderei manter-me sereno sem meditar formalmente?
Parar e respirar conscientemente sempre conduz a uma mudança na paisagem mental. No livro The Wellness Book, Herbert Benson sugere um exercício para o momento em que estivermos presos num congestionamento de trânsito, o qual, adaptado, pode ser útil em outras situações em que nos percebamos à beira de um ataque de nervos:

  1. Pare.
  2. Respire e relaxe.
  3. Reflita e faça a si mesmo estas perguntas:
  • O que está acontecendo comigo?
  • Por que estou tão nervoso?
  • Estou atrasado ou apenas correndo contra o relógio?
  • É realmente um problema estar atrasado?
  • Se eu estiver atrasado, qual é a pior coisa que pode acontecer?
  • A preocupação irá ajudar? Opte por não ficar tão ansioso.
Olhe
WWW.ANDYNEWBERG.COM
O site resume, em inglês, as pesquisas do cientista Andrew Newberg sobre a base biológica dos fenômenos místicos e os efeitos da meditação e da oração no funcionamento do cérebro. Há referências ao estudo relatado no livro Why God worít Go away, acompanhadas de imagens do cérebro dos medita-dores e freiras pesquisados, obtidas com tomógrafos de emissão de pósitrons antes e no clímax das práticas contemplativas.
WWW.BODSATVA.ORG

Ensinamentos do lama brasileiro Padma Samten sobre treinamento em meditação, seus obstáculos e outros temas do budismo tibetano e do zen.
www.dharmanet.com.br

Neste site budista, um dos mais completos do gênero em português, há instruções detalhadas para a prática de shamata, a meditação estabilizadora, e ensinamentos sobre vipassana e outros tipos de meditação budista.
WWW.MBMI.ORG

Site do Mind/Body Medical Institute, fundado pelo cardiologista Herbert Benson, da Universidade de Harvard. Informa, em inglês, sobre as atividades do instituto e sobre os estudos realizados por Benson, um dos pioneiros da moderna pesquisa da meditação.
www.monjacoen.com.br

Ensinamentos da monja Coen Sensei, missionária oficial da tradição Soto Shu — Zen-Budismo, com sede no Japão, e primaz fundadora da Comunidade Zen-Budista, criada em 2001.
www.visaofuturo.org.br

Site do Instituto Visão Futuro, dirigido pela monja e doutora em psicologia Susan Andrews. Cursos e vivências meditativas segundo a tradição tântrica do hinduísmo.
www.yoga.pro.br

Organizado pelo professor de ashtanga vinyasa yoga Pedro Kupfer, o site traz centenas de artigos sobre yoga e meditação, escritos por Kupfer e outros especialistas.

terça-feira, 4 de setembro de 2007

A Doutrina do Corpo

A Doutrina do Corpo
Sato Tsuji

Sato Tsuji é um filósofo japonês contemporâneo e um conhecedor da filosofia ocidental. Segundo a tradição oriental, para ele a filosofia é mais que um esclarecimento da existência por meio do pensamento. Ela significa para ele ver a vida “com o corpo”.

Se a forma verdadeira do Ser humano aparece na posição ereta do tronco, o caráter do homem também precisa se manifestar por uma concretização dessa posição. Para manter essa posição, é necessária a tensão da “força de vontade”. Se esta diminui, os quadris se tornam fracos e assumem uma postura em que a região estomacal e a barriga ficam encolhidas. O peito está cercado pelos ossos das costelas que, naturalmente, não se podem dobrar. A barriga, ao contrário, está apenas apoiada pela espinha dorsal. Esta, por seu lado, compõe-se de uma série de ossos e vértebras e por isso não é possível curvá-la. Assim, deve se manter impreterivelmente ereta a vértebra lombar, senão essa parte se verga por si mesma, sob o peso do busto. Isso, porém significa que a inclinação material prevaleceu e que a pessoa se tornou passiva.
A kyusho (a mais importante, mais forte e, ao mesmo tempo, mais sensível parte do corpo, por assim dizer, a alma do corpo), situa-se no koshi (por koshi, o japonês entende a parte inferior do tronco abaixo do umbigo). Para se confirmar a força de caráter de uma pessoa pela postura, esta deve estar pressionando as nádegas um pouco para trás, colocando a força no koshi, à medida que faz dele uma pedra fundamental firme e duríssima sobre a qual repousa levemente a parte superior do corpo. A planta só adquire sua posição ereta com o apoio da terra. O homem, ao contrário, mantém-se ereto por si. Para isso deve existir um ponto de apoio nele mesmo, no próprio corpo, e esse ponto está enraizado no koshi. Se o koshi não está carregado de energia, o corpo não tem mais o centro em si mesmo e será puxado para baixo, para o centro vital que existe “fora dele”. Então acontece o descontrole dos membros.

O corpo perde seu sentido como vida subjetiva independente. Manter o koshi ereto é uma forma de afirmar a postura física ativa do homem. Podemos deduzir isso também da língua, pois existe a expressão koshi wo irer (introduzir o koshi), no sentido de dar estabilidade a algo oscilante) e, além desta o koshi wo suete kakaru (assentar o koshi e começar algo com o koshi assentado, no sentido de: começar algo com uma constituição bem firme).
Quando a parte superior do corpo é pesada e o abdômen, ao contrário, é leve, isso significa que esse homem tem uma constituição física na qual a vida é limitada pela materialidade. O mais elevado será puxado para baixo pelo menos elevado. Ao contrário, a parte inferior, pesada, ligada à parte superior, mais leve, do corpo demonstra uma constituição em que o homem tem caráter e vence a matéria. É isso que corresponde à lógica da vida. O que concretiza a lógica do ser vivo corresponde também à norma fisiológica. Quando mantemos o tronco ereto e deixamos o koshi pesado, ativamos a circulação sangüínea na parte inferior do corpo e sentimos calor no abdômen; cabeça fria e pés quentes há muito é considerado um sinal de saúde e, em contraposição, uma cabeça quente e pés, quadris e nádegas frios são largamente conhecidos como sinal de falta de saúde.
Hakuin Zenshi disse em Yasenkanna: “O caminho para cuidar da vitalidade consiste em manter a parte superior do corpo fresca e revigorada e manter aquecidas as partes inferiores.”
Para conseguir a posição correta do corpo humano, deve-se primeiramente encher o abdômen com a energia (genki) do corpo interior. Encher de energia o koshi significa, ao mesmo tempo, tensionar levemente os músculos da barriga. Quando tensionamos os músculos abdominais, aparece como núcleo dessa tensão um ponto de concentração sob o umbigo. Esse ponto de concentração chama-se kikai tanden. A arte desse fortalecimento – tanden (rentan) é a de liberar todas as forças instaladas nas diversas partes do corpo e concentra-las totalmente, de forma especial, no Tanden. O volume da parte inferior do corpo altera-se um pouco, visto de fora, mas ela parece firme. Assim na parte inferior do corpo efetua-se a mudança, embora o volume do ventre mude.
Nesse exercício, a inspiração é rápida, e a expiração, ao contrário, muito lenta, enquanto se fortalece pouco a pouco o Hara. Isso não significa, porém, que se economize o ar ao expirar. Retrai-se um pouco o queixo e abre-se ampla e largamente a base Hara (hara-no-soku) e expira-se forte e totalmente o ar. Essa expiração deve ficar cada vez mais volumosa quando se aproxima do seu término, a ponto de o pescoço dilatar. Mas quando não se tem nenhuma força na base do Hara, a expiração é resfolegante; mas quando se expira realmente, partindo da base da barriga, ela se torna forte e fluente.
O abdômen e as nádegas se completam, um como lado frontal e as outras como a parte traseira que formam a base do tronco e, dessa maneira, uma unidade especial. A força do koshi é uma energia com a qual se fixa a base do tronco.
Deixar que a energia do koshi flua significa manter as nádegas firmes ou contrair o abdômen. Se as nádegas são pressionadas para trás e o abdômen é empurrado para a frente, então se estabelece a base do tronco como se ele fora uma rocha. O osso ilíaco fica ereto, e forma-se entre as nádegas e o abdômen um eixo perpendicular ao corpo (taiku).
Deixar que a força do tanden flua “para dentro” não significa repousar o peso da parte superior do corpo sobre o abdômen. Quando se deixa a força fluir para dentro do koshi, o abdômen suporta a parte superior do corpo e obtém, por assim dizer, um caráter nominativo. Procurar a fonte de força do koshi na parte superior do corpo seria, portanto, um erro. Se pressionássemos ativamente a força do Tanden “para dentro” como se estivéssemos fechando um buraco com uma tampa, o corpo se entortaria e não alcançaria sua forma natural. A parte superior do corpo definiria o resto dele. A energia que enche o corpo deve ser, afinal, uma força que atue como se a parte superior do corpo não existisse. As forças do corpo inteiro são reunidas na base do tronco como se o abdômen crescesse na vertical a partir do centro da terra. O koshi carrega a parte superior do abdômen com uma força que age de baixo para cima. Se a força se concentra no Tanden, o ânus se contrai.
A postura em que a parte inferior do corpo é pesada e a parte superior do corpo leve faz com que se desenvolva necessariamente uma estrutura corporal com um koshi forte e um abdômen abaulado para a frente. Quando se adota uma postura correta, a gravidade do corpo recai inteira sobre o centro do osso ilíaco e o koshi torna-se inquebrável. Nada mais nos resta do que concentrar a força natural do abdômen. Ao se colocar a força no abdômen, os músculos da barriga se distendem de maneira agradável e sente-se a força aumentar no corpo inteiro. No momento da expiração, a tensão abdominal é mais forte, tão forte que um punho poderia ricochetear se fizesse pressão contra ele. Hakuin Zenshi comparou esse abdômen, em seu livro “Yasenkawa”, como uma “bola que ainda não tinha sido batida pela vara do bambu”. (Fala-se da força potencial, da elasticidade da bola.) Ele é parecido com uma bola de borracha.
Ao se esvaziar o peito, deve-se prestar atenção na parte superior do estômago. Esse local fica na dobra abaixo das costelas e acima do umbigo, e corresponde à parte chamada alto-ventre em oposição ao baixo-ventre. Quando o koshi se dobra, esse local se retrai. Pode-se ainda concentrar a força do corpo inteiro no Tanden se este também se retrair, mantendo-se o koshi ereto e tensionando-se o abdômen com a expiração. Antes de inspirar, nosso peito está vazio. O ar enche o tórax e, naturalmente, infla a região acima do umbigo. No processo de expiração a força dos músculos estará concentrada no abdômen. Então a parte superior da barriga se contrai naturalmente como se esta fosse sugada para dentro.
Se o koshi é o local mais importante para se conseguir a postura correta, podemos dizer que a nuca ocupa o segundo lugar importante. O koshi e a nuca são as partes mais instáveis de todo o corpo. A ligação do corpo com a cabeça é o pescoço, que deve ser fino e ter bastante mobilidade. Dependendo da posição da cabeça, a verdadeira firmeza do corpo se concentra na cabeça e no troco. Para conseguir-se a unidade do corpo inteiro é preciso procurar fazer o centro de gravidade cair exatamente na linha vertical do tronco. Os mestres ensinaram que se deve manter as vértebras cervicais posteriores eretas e concentrar a força na nuca. Como exercício, deve-se puxar o queixo de tal forma que “se sinta dor atrás das orelhas”.
Quando o peito se eleva, os músculos da barriga sobem e a musculatura do corpo inteiro se deforma. A força no koshi diminui. Não é saudável colocar a força no abdômen de forma violenta, nessa posição física desfigurada. Deve-se extrair a força que revigora os músculos da nuca da força criadora do koshi.
Uma vez que a nuca e o tronco são um só, e que os músculos da nuca não se deslocam nem se contraem, a cabeça aparece diretamente “desligada” do tronco, como se flutuasse no espaço. A cabeça é o céu, o tronco a terra. O céu e a terra, que afinal são “um” só, estão no contexto dessa unidade divididos numa duplicidade que provoca, assim, uma unidade maior, o Tenchi organizado (cosmos).
Os ombros devem ser vistos como uma das partes mais importantes do corpo no exercício da postura correta. Na postura correta, é importante deixá-los soltos. A verdadeira forma do corpo físico só se realiza quando os ombros se descontraem para o centro, confirmando dessa maneira ativa o verdadeiro vazio do céu e a plenitude da terra.
Quando se deixa os braços pendentes à vontade por longo tempo, eles se voltam para o centro vital. Deve-se portanto ter a sensação de que se deixou os braços cair no centro vital desde a ponta dos dedos até suas raízes.
Ao abrir as pernas num ângulo moderado, a sede do centro de gravidade torna-se mais ampla e o grau de estabilidade aumenta.
Já que o Tanden nada mais é que uma vivência da grande unidade transmitida a uma vida singular, o filósofo também deve conquistar a autoconsciência do Tanden como o exercício físico.

Tenbin

O bastão é provavelmente uma das primeiras armas que o homem usou para se defender ou caçar. Era facilmente encontrado e não era muito difícil de manejar. O bo provavelmente teve origem num bastão chamado tenbin, que era posto ao longo dos ombros para transportar peixe ou baldes de água.
Tenbin também pode ser entendido como uma balança, que tem o mesmo princípio do bastão para trasporte.
Como técnica o tenbin deve ser aplicado com muito cuidado para não lesionar o seu companheiro de treino. Por isso aconselha-se a executar a entrada em Yin (lado interno do braço) e depois na projeção em Yang (lado externo do braço).
Ainda na entrada, não bater no cotovelo do uke e sim utilizar o seu braço como um rolo (rolo de amassar pão ou massa). Faça com que o braço do seu parceiro de treino role sobre o seu braço até chegar na posição certa.
Seu braço deverá estar orenaite (braço inflexível - impossível de se flexionar) e próximo do seu hara para que o uke fique desequilibrado e na ponta dos pés.
O cotovelo não deve ser utilizado como ponto de apoio para a projeção (ou simplesmente projetar o parceiro pelo cotovelo), deve-se desequilibrar o uke através do ombro, sendo o cotovelo apenas a ferramenta para que isso aconteça. Da mesma forma o nage deverá iniciar a projeção pelo quadril e rotacionando a mão (e assim seu braço) de Yin para Yang, assim todo o corpo do nage funcionará como uma onda.